O que está em causa no 60.º aniversário do Tratado de Roma?

24 de março de 2017
PSD

No dia 25 de Março de 1957 foi assinado o Tratado de Roma. É o seu aniversário que agora se celebra com pompa e circunstância. E se é certo que devemos comemorar a ocasião, não é menos verdade que a tentação da complacência tem de ser resistida a todo o custo. A crise existencial que a Europa atravessa pura e simplesmente proíbe uma celebração auto-congratulatória. Mas, ao mesmo tempo, não devemos permitir que as dificuldades que atravessamos no continente façam perder de vista tudo o que a Europa alcançou nestes últimos 60 anos. E tudo somado não foi pouco.

A Europa conseguiu vencer os totalitarismos fascistas e comunistas. Na Europa do Sul foram varridas ditaduras opressivas, iníquas e retrógradas. Em todo o continente formou-se uma unidade em torno do modelo social europeu centrado numa economia social de mercado e na dignidade da pessoa humana, uma originalidade europeia e que se converteu num exemplo para muitos outros povos. Constituíram-se sociedades orientadas pelos valores da liberdade, da igualdade de oportunidades, da tolerância e da abertura. Associaram-se os Estados para cooperarem nos mais diversos domínios e para partilharem a sua soberania no sentido de consolidar os ganhos económicos, sociais e políticos.

Os trinta e um anos de integração de Portugal na Europa fazem parte desta história. E apesar de todas as dificuldades que os Portugueses enfrentam há mais de 15 anos, e dos erros cometidos ao nível europeu, a Europa continua a ser o espaço político e de valores com que Portugal conta para o progresso da nossa sociedade nas suas múltiplas dimensões. Embora tentador para muitos, torna-se perigoso esconder sempre atrás da Europa os erros políticos que cometemos cá dentro. Quando nos anos 70 e 80 o compromisso da maioria esmagadora da sociedade portuguesa com o projeto de integração europeia se traduziu numa decisão política inequívoca, os propósitos e objectivos das forças políticas e sociais europeístas eram simples de descrever: lançar a sociedade portuguesa numa rota de prosperidade e de convergência com os padrões de vida dos nossos parceiros; ancorar as instituições democráticas recém-instituídas e o Estado social de Direito; fazer face a desafios estruturais do nosso atraso relativo com o apoio dos nossos aliados; enfrentar em conjunto problemas regionais e globais que excedem as capacidades do Estado-nacional. Ora, todos estes propósitos se mantêm válidos hoje. E esse facto merece ser recordado nesta ocasião.

Mas a comemoração não pode ser marcada pela complacência. A Europa atravessa um momento de crise que nem o bom momento económico da grande maioria das suas economias (o melhor desde há muitos anos) permite disfarçar. Renovar os valores que fundaram a Europa das comunidades, e recordar os propósitos nacionais que nos levaram à adesão, deve servir para sermos exigentes no que diz respeito à preparação do futuro comum. Sabemos exatamente o que devemos fazer, e, por conseguinte, não nos devemos dispersar nem distrair com discussões mais ou menos estéreis. Temos de renovar a integração naqueles pontos que assinalam necessidades manifestas e problemas mais do que diagnosticados e discutidos: na reforma da União Económica e Monetária, com a criação de um Fundo Monetário Europeu, proposto por Pedro Passos Coelho em 2015, com funções de coordenação do investimento pan-europeu, das reformas estruturais com impactos transversais no conjunto dos Estados-membros e com uma capacidade orçamental; no aprofundamento do Mercado Interno, em particular nas áreas da energia, do digital, da União Bancária (com a criação de um mecanismo de garantia de depósitos comum) e da União Financeira; na gestão e proteção das fronteiras externas; na política de migrações e num sistema comum de asilo; na segurança interna e cooperação dos serviços e agências dedicadas a este domínio.

Deixar tudo como está não é uma opção viável. Mas se sabemos o que devemos fazer em conjunto, não vale a pena inventar. Apostemos na formação dos apoios políticos necessários para levar a cabo as reformas urgentes. É com esta confiança realista que devemos prosseguir o nosso caminho, em Portugal e na Europa, sem receio de combater os extremismos de direita e de esquerda, sejam eles de que proveniência forem.

Numa era de incertezas, é importante tornar mais firme e mais claro o ideário europeu. E, não menos importante, agir em consequência.

 

Miguel Morgado

Vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD