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O Ministério da Cultura, em parceria com a RTP, decidiu promover um projeto, criado pelo Governo, no quadro de apoio e no âmbito da crise causada pela pandemia covid-19, destinado exclusivamente ao setor da música. A ministra Graça Fonseca disponibilizaria, de imediato, 1 milhão de euros para um conjunto de protegidos de um ecossistema de elites, à margem de uma comunidade de artistas, livre e independente, que também está a sofrer com as consequências do estado de emergência do País.
Mas após uma chuva de críticas, dúvidas e questões, com origem no próprio setor, sustentadas por uma petição pública online, com mais de 20 mil subscritores, o TV Fest acabou por ser suspenso antes da estreia, com o argumento de o projeto ser repensado.
De facto, quando há premência na aquisição de máscaras, luvas, testes e é estranho que apareça tão rapidamente 1 milhão de euros, para organizar uma espécie de Festival da Canção Covid-19, para 120 artistas selecionados a dedo e sem qualquer critério, excluindo milhares de profissionais do meio cultural, que na sua esmagadora maioria nunca receberam um único incentivo do Estado e que hoje, tal como muitos portugueses, estão em sérias dificuldades, ao nível das necessidades básicas.
Não faz qualquer sentido. Uma espécie de contrassenso daqueles que frequentemente reclamam e invocam para si, a bandeira da igualdade social.
O Governo fez aprovar um diploma, com o apoio do PS e de toda a esquerda, que permitirá a libertação de 2.700 reclusos, o que corresponde a cerca de 20% da atual população prisional, para “salvaguardar a vida e a integridade física dos reclusos que, pela especial vulnerabilidade do seu estado de saúde, estão mais expostos ao risco de contração da doença covid-19”. Cerca de 800 já estão em liberdade.
Mas na realidade, não há um único recluso infetado e os reclusos já estão, pelas próprias circunstâncias, confinados num espaço seguro e a salvo do risco de contágio.
Excecionando, naturalmente, os crimes mais graves que, trata-se de um perdão generalizado, sob pretexto de razões humanitárias, que desautoriza a soberania judicial e pode, a médio prazo, criar alarme social e fazer disparar os índices de pequena criminalidade. Uma medida que deveria ser excecional e que, pela aplicação automática de uma bitola temporal, liberta de forma definitiva.
A ministra da Justiça que garante que não há sobrelotação nos estabelecimentos prisionais, contrariando o que é óbvio e a própria estatística, na verdade, a pretexto da pandemia, e sem nenhum critério, resolve, na prática, um problema que continua a jurar a pés juntos não existir.
Se na cultura os critérios se identificavam pela conveniência, os requisitos da justiça primam pela ausência de rigor e objetividade.
Não faz qualquer sentido. Uma espécie de negação, daqueles que, com regularidade, reclamam para si, a bandeira dos direitos humanos.
Um Governo que manifesta o direito à indignação perante o egoísmo de governos de outros Estados, não pode desconsiderar a autocrítica e ser também exigente quanto às suas decisões, elas próprias contraditórias. Quero acreditar que temos um Governo que serve a cultura e defende a liberdade e a segurança dos seus cidadãos, com coragem e sem preconceitos, sobretudo em nome do patriotismo que se impõe em tempo de guerra.
Finalmente, uma nota pessoal, para o rodapé infeliz de uma peça Portofóbica que a TVI passou em prime time e que atribuía a maior incidência da pandemia no Norte, ao facto de a população ser mais pobre e menos educada.
Retrataram-se, é certo, mas ao que parece, alguns nem na desgraça têm a humildade de ver o País como um todo e valorizar a coesão territorial, em nome da solidariedade que o momento impõe.
Sem pretender generalizar ou alimentar quaisquer polémicas regionalistas, importa dizer que no Norte as pessoas são tão ou mais sinceras, mais solidárias e mais empreendedoras que no resto País. E embora sejam portugueses, iguais a todos os outros, são humildes o bastante para não se sentirem superiores a ninguém.
Na verdade, o vírus não conhece fronteiras e, nos dizeres do grande profissional da RTP, Hélder Silva “não distingue a educação, a cultura, os pontos cardeais e nem sequer a pronúncia”.
Orgulho, muito orgulho, nas minhas origens. Por isso, pelas palavras de Agustina Bessa-Luís, quero fazer uma dedicatória especial a todos aqueles que pensam o contrário: “Vivo aqui, mas o Porto não é para mim um lugar; é um sentimento”.
Artigo publicado originalmente no Povo Livre.