Almaraz: um acordo que não é nada

21 de fevereiro de 2017
PSD

“É atirar areia para os olhos das pessoas”, uma “manobra política” e um “bom acordo para Espanha”. Para a deputada do PSD Berta Cabral, o anúncio de que os governos de Portugal e Espanha encontraram uma “resolução amigável” para o litígio entre os dois estados sobre a construção de um armazém de resíduos nucleares Almaraz não passa de propaganda política plantada por razões de conveniência e de marcação da agenda, precisamente no dia em que o ministro do Ambiente foi ao parlamento português falar sobre política geral do Ministério e outros assuntos de atualidade. “É um bom acordo para Espanha. Para Portugal, não traz nada de novo. Com este acordo, Espanha não muda de opinião, apenas ganha tempo”, sintetizou desta forma a deputada social-democrata a posição do PSD, durante uma audição a?o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, esta tarde.

Berta Cabral lembrou que o suposto entendimento foi alcançado na Cimeira de Malta, realizada em 3 de fevereiro, estranhando a oportunidade por só agora ser tornado do conhecimento público. “Não resolve o problema do armazém, não trava a construção do armazém, não resolve o problema do prolongamento da Central Nuclear de Almaraz”, alertou Berta Cabral.

A deputada do PSD exigiu ao ministro do Ambiente uma posição “firme” na defesa do interesse de Portugal, referindo que o ministro tem de “zelar” nesta questão e tem de a integrar na agenda da Cimeira Ibérica.

A associação ambientalista Quercus considerou insuficiente o acordo tripartido entre os governos de Portugal e de Espanha e a Comissão Europeia sobre a central nuclear de Almaraz. Trata-se de "uma medida de caráter essencialmente político e insuficiente, e que ainda não corresponde às verdadeiras expetativas da sociedade portuguesa". A Quercus defende a revogação de uma declaração de impacto ambiental favorável à construção de um armazém de materiais radioativos e que "Portugal possa participar devidamente no processo de consulta pública". Recomenda ao Governo que acelere esforços para garantir a participação portuguesa no processo que envolve a central, cujo encerramento a Quercus defende, sem renovação da licença de funcionamento que expira em junho de 2020.

Por sua vez, a associação ambientalista Zero observou que Portugal não devia ter retirado a queixa contra Espanha, apesar de achar que o diálogo acordado com Espanha é positivo. "É um grande recuo no cumprimento estrito da legalidade", em particular da diretiva que "obriga à discussão dos assuntos transfronteiriços, de que Portugal não devia ter abdicado, apesar de poder voltar a retomar a queixa" se considerar que a negociação não resulta, diz a associação em comunicado. A Zero acusa Espanha e os donos da central nuclear de Almaraz de "enorme falta de transparência e inflexibilidade" e quer saber se houve contrapartidas para Portugal retirar a queixa. O que a Zero pretende é garantir que a central fecha em 2020, ano em que termina a sua licença, por isso considera "completamente desnecessário" construir tal armazém.

Berta Cabral questionou ainda o ministro do Ambiente sobre a exploração de minas de urânio a céu aberto, atingindo uma profundidade de 120 metros e autorizada a laborar durante 10 anos, entre Retortillo e Vilavieja de Yeltes, a poucos quilómetros do distrito da Guarda.

 

Nuclear: Governo não defende o interesse nacional

Nunca como hoje a opinião pública e publicada estiveram tão atentas para as questões relacionadas com a energia nuclear. São frequentes as notícias sobre incidentes em centrais nucleares. Nos últimos dois meses, foi noticiado o encerramento de mais de 20 centrais nucleares em França, por decisão da Agência para a Segurança Nuclear Francesa; um incidente na central nuclear belga de Doel, localizada próximo da fronteira holandesa, provocou protestos das autoridades holandesas e alemãs; uma explosão na central nuclear de Flamanville em França; a Central Nuclear eslovena de Krško, com mais de 35 anos, entrou em paragem automática por causa de problemas de refrigeração.

Notícias como estas vão ser cada vez mais comuns se considerarmos a quantidade de reatores ativos no mundo que estão em fim de vida ou já foram alvo de prorrogação de prazo.

A Alemanha vai encerrar o parque nuclear mesmo antes dos 40 anos e Espanha anuncia a reabertura da Central Nuclear de Garoña (Endesa e Iberdrola) e como se esperava, há precisamente uma semana, foi noticiado que que as empresas que exploram Almaraz Endesa, (Iberdrola e União Fenosa), duas delas são as mesmas que exploram La Garoña, que vão apresentar em junho o pedido de renovação da respetiva licença de produção.

Nada que não fosse previsível. A única surpresa são as declarações não desmentidas do ministro do Ambiente, no dia 6 de janeiro, em Bragança, em que afirma que “Espanha ainda não tomou uma decisão sobre o prolongamento da Central de Almaraz, acrescentando que é uma decisão que cabe unicamente ao Governo daquele país e as empresas”.

Juntam-se mais dois episódios insólitos:

  • Membros da Ordem dos Engenheiros portugueses foram impedidos de visitar a Central de Almaraz e intimados pela polícia espanhola, apesar de terem obtido autorização prévia para realizarem a visita.
  • As empresas que exploram aquela Central, Endesa, Iberdrola e União Fenosa, recusaram-se a vir à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação? para uma audição proposta pelo BE e aprovada por unanimidade.

Tudo isto revela um sentimento de culpa e de desrespeito pelas autoridades portuguesas.