Ações imediatas vs. Unanimidades tardias

31 de março de 2020
PSD

A discussão sobre os Eurobonds já não é nova e nunca chegou a bom porto. Mas a discussão atual não é sobre a mutualização das dívidas nacionais; é sobre financiar uma resposta comum e solidária.

E se um tsunami tivesse atingido a Holanda? Alguém na União Europeia recusaria ajudar os holandeses, culpando-os porque constroem abaixo do nível da água ou porque não se prepararam para catástrofes que não escolhem países, nem pessoas, nem economias?

Não. Isso não aconteceria. Tal como não aconteceu com os incêndios na Grécia e na Itália, com os desastres naturais na Madeira, e com tantas outras situações que, acontecendo, exigem colaboração e não hesitação ou reticência.

Nós, que acreditamos no projeto europeu, não vivemos com a obsessão de perceber que países têm sido mais favorecidos com o euro, mas sim com os países têm sofrido mais com a insularidade ou com o nível de desenvolvimento social. Vivemos a europa assim porque a construímos, todos os dias, com solidariedade. E, portanto, quando algum dos nossos sofre de uma catástrofe natural, corremos a ajudar como podemos porque, afinal, é mesmo como se um dos nossos se tratasse. Apesar de tudo o que possa ser apontado à UE, não há comparação possível entre o que somos hoje e o que éramos há 30 anos atrás: todos os que fazem parte deste projeto saíram a ganhar.

A discussão sobre os Eurobonds já não é nova e nunca chegou a bom porto. Mas a discussão atual não é sobre a mutualização das dívidas nacionais; é sobre financiar uma resposta comum e solidária, é sobre Coronabonds: não sobre criar um novo mecanismo para tempos normais, mas para chegar a uma solução excecional para tempos excecionais.

Desta vez não é da cigarra e da formiga que estamos a falar.

Desta vez estamos a falar de uma resposta comum a um problema comum. Se a ameaça não escolhe pessoas nem nacionalidades, nós também não nos podemos centrar nas diferenças entre países.

Desta vez precisamos de salvar vidas, e isso não depende de quem está neste ou naquele Governo, não depende da cultura de cada Povo, não depende de opções políticas nacionais. Se a União Europeia não serve para apoiar financeiramente todos os países que vivem a mesma situação de crise sanitária, então já não servirá para manter o projeto de paz que a fundou! Se a União Europeia não socorrer as vítimas, a União será ela própria vítima do COVID, e dificilmente, a curto ou médio prazo, sobreviverá.

António Costa esteve bem quando criticou o discurso do ministro holandês. Mas a crítica por si não muda nada. Em Bruxelas, como aqui em Portugal, vão existir sempre líderes políticos a fazer tudo para que a Europa não consiga dar soluções em conjunto, porque têm esse objetivo: de que a Europa seja sempre o problema, e nunca a solução. Vão continuar a existir líderes capazes de bloquear decisões de consenso dentro da sala, para depois cá fora dizer que a culpa é de uma UE que não funciona.

Os Chefes de Estado e de Governo saíram da videoconferência com uma narrativa diferente. Deram ao Eurogrupo (portanto aos Ministros das Finanças dos países do Euro) a incumbência de pensar em soluções. Mas podemos acreditar que os Ministros das Finanças tenham posições diferentes dos seus primeiros-ministros? Não.

Porém, temos sinais para acreditar numa demonstração de liderança. A Alemanha terá em breve a Presidência da UE, e quero acreditar que Merkel dará o exemplo e contribuirá para responder à crise, mobilizando todos os países para uma solução conjunta.

Se tal não acontecer, se uns acharem que é melhor tratar de si ou que não vale a pena minimizar riscos agora, porque estamos condenados a enfrentar o vírus por muito tempo, então não poderemos ficar presos em votações por unanimidade. Avancemos com uma solução conjunta apenas dos que estão disponíveis para colaborar: uma solução alargada cedo é melhor do que uma solução unânime que tarde em vir ou que nunca venha.

Aguardar que a crise económica nos bata à porta não funciona; apenas reduz a capacidade de intervenção precoce e atrasa a retoma que se deseja. O tempo é de ação: assumam-se os líderes.

Publicado originalmente no Expresso.