O governo do Partido Socialista pretende varrer para debaixo do tapete, neste caso para o subsolo, os problemas que não tem conseguido resolver em matéria de ambiente. O enchimento de pedreiras com resíduos de construção é uma solução de fim de linha, com riscos para as populações e para os recursos naturais, que reflete a incapacidade de reciclar e de dar outro destino a materiais que podem ser reaproveitados numa lógica de economia circular.
A 30.12.2021, a revista Visão noticiou que há “via aberta para colocar solos contaminados nas pedreiras – é assim que está a ser considerada, no setor do ambiente, entre empresas e ambientalistas, a nota técnica relativa a operações de enchimento de vazios de escavação que saiu este mês”.
A situação só não é mais grave porque o PSD pediu a Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei nº 102-D que aprova o regime geral da gestão de resíduos e o regime jurídico da deposição de resíduos em aterro, um diploma feito à pressa pelo governo com múltiplas lacunas, tendo conseguido introduzir alterações para evitar esta situação.
A APA, em resposta ao artigo da Visão, publicou na sua página de internet um esclarecimento onde afirma: “Importa salientar que com a publicação da nova legislação foram significativamente reduzidas as tipologias de resíduos passíveis de ser utilizadas em operações de enchimento de vazios de escavação...”.
Infelizmente, e apesar da ação do Grupo Parlamentar do PSD na imposição de maiores restrições, continuam a não estar salvaguardados todos os aspetos de segurança e de proteção do ambiente. Não se compreende como será possível que resíduos contendo vidro ou fibrocimento possam ter como destino pedreiras e outros locais semelhantes.
O deputado Bruno Coimbra, coordenador do PSD na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, defende que “é necessário olhar para este assunto com uma perspetiva mais abrangente para compreender as razões que poderão justificar este reiterado interesse em ter vazios de construção preenchidos com resíduos. É, na verdade, um reflexo do falhanço generalizado na política de resíduos, as metas transformaram-se em miragens e há incapacidade em reformar o setor”.
As evidências estão no último Relatório do Estado do Ambiente 2020-2021, publicado a 17 de dezembro. A produção de Resíduos Urbanos tem crescido desde 2013, quando já deveríamos ter invertido a tendência (até subimos 0,1% face a 2019). A taxa de preparação para reutilização e reciclagem ficou nos 38% não atingindo a meta de 50%. A deposição de Resíduos Urbanos Biodegradáveis (RUB) em aterro aumentou para 53% quando era preciso descer para 35%. Continuamos a remeter para aterro 40,8% dos Resíduos Urbanos em Portugal, um valor excessivamente elevado e que conduzirá ao esgotamento da capacidade da receção dos aterros que, em muitos casos, recebem também resíduos industriais.
Para reduzir a pressão sobre estas infraestruturas é necessário encontrar outras soluções para resíduos como aqueles que são resultantes da construção e demolição de edifícios. É aqui que entraram as pedreiras e outros locais com necessidades de enchimento. Face ao esgotamento de aterros e face à incapacidade de colocar este fluxo a funcionar, criando circuitos de recolha e reciclagem adequados, procura-se “varrer” o problema para o subsolo, com todos os riscos inerentes.
Contudo, o subsolo está completamente desprotegido após seis anos inércia e incúria governativa. O projeto legislativo relativo à Prevenção da Contaminação e Remediação dos Solos (PRoSolos) ficou na gaveta desde 2015. Estabeleceria o regime jurídico da prevenção da contaminação e remediação dos solos, com vista à salvaguarda do ambiente e da saúde humana, fixando o processo de avaliação da qualidade e de remediação do solo, bem como a responsabilização pela sua contaminação, assente nos princípios do poluidor-pagador e da responsabilidade. Com este regime por concluir, Portugal continua a ser dos países mais desprotegidos da União Europeia. São públicos vários casos graves que envolvem solos contaminados e riscos para as populações locais. Em Matosinhos, o próprio Primeiro-Ministro reconheceu que o encerramento da refinaria da GALP estava a descurar a proteção do solo e o interesse das populações.
O PSD, ao longo das duas últimas legislaturas, exigiu a publicação do regime Prosolos e introduziu alterações em vários diplomas legais para reduzir os riscos ambientais. Em 2021, requereu duas importantes Apreciações Parlamentares - do Regime Geral de Gestão de Resíduos e da Lei das Minas - onde o PSD conseguiu aprovar vários artigos. Nestes e noutros casos vimos o governo a agir com pressa, arrogância e desprezo por quem não pactua com as suas intenções.
Num momento em que se avizinham eleições legislativas importa assumir o compromisso com a correção do descalabro na política de resíduos para evitar que se generalizem soluções de fim de linha, como “pedreiras transformadas em lixeiras”, e que se cumpram as metas que existem para o setor.
Depois do Governo ter mantido na gaveta durante seis anos o diploma Prosolos, e após múltiplas interpelações do Grupo Parlamentar do PSD face à irresponsabilidade do PS nesta matéria, defendemos a publicação e atualização urgente deste regime legal para proteger as populações de solos contaminados e de outros passivos ambientais que tardam em ser corrigidos.