Opinião: Desconstruindo demagogias… pela coerência de atitudes

19 de dezembro de 2018
PSD

Temos assistido às declarações do Sindicato do Ministério Público (SMMP) relativamente à possibilidade de ver discutida na Assembleia da República (AR) a composição do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).

Acredito que o cidadão menos avisado que os ouça fique perturbado e embale na canção de perfil populista de o poder político querer controlar o MP, “escolhendo quem deve ou não deve ser investigado”, tudo a reboque de uma pretensa vingança por determinados políticos e pelo poder económico a estes associado, terem sido investigados pelo MP.

Esta visão apocalítica é falaciosa e deturpadora do diálogo que deve ser esclarecido e lúcido. Além de ser desprimorosa para os magistrados do MP.

Com efeito, esta visão do SMMP passa um atestado de inimputabilidade a todos os procuradores que, obedientemente como cordeiros num manso rebanho, acatariam as ordens que lhes seriam dadas, sem sequer as questionar, em cega obediência, como se fossem todos acéfalos. E como se não existissem mecanismos de denúncia.

O MP não é este corpo amorfo e sem inteligência ou vontade. É uma magistratura organizada, bem preparada e com sólidos princípios de seriedade enraizados. Nunca se deixaria “eliminar” por qualquer hipotética tentativa de “controlo político”.

Mas querer fazer crer que discutir a composição dos membros que integram o CSMP é equivalente a uma tomada de assalto por parte do poder político é inaceitável. Até porque o tal poder político seria a AR e eventualmente o Presidente da República, com toda a pluralidade democrática inerente.

Hoje a composição do CSMP não obedece ao princípio democrático da representatividade dos cidadãos. E é o único conselho superior das magistraturas em que tal acontece. A desproporcionalidade existente leva a que não seja possível qualquer tipo de escrutínio (e não controlo!) sobre a atividade do MP, que permanece opaca e indecifrável aos olhos dos cidadãos e do próprio MP, como veremos adiante.

A nossa Constituição não refere o número de membros magistrados e não magistrados que devem compor o CSMP. Dispõe apenas sobre a origem dos mesmos. Aditar membros da sociedade civil eleitos pela AR e eventualmente designados pelo Presidente da República não belisca a autonomia que todos os magistrados do MP detêm e têm a obrigação de fazer valer. É por ser tão necessário um MP eficaz que deve ser robustecido com uma maior legitimidade democrática. E basta ver as personalidades nacionais de reconhecido mérito que têm sido eleitas pela AR e indicadas pelo Ministro da Justiça para facilmente se intuir que não são “cunháveis” ou “paus mandados” do poder político.

São é em número muito inferior aos membros magistrados, o que os pode tornar inoperantes, designadamente na eliminação dos tiques corporativos. Daí que seja incompreensível a atitude do sindicato, ameaçando com uma greve apenas pela possibilidade de o Parlamento debater, livremente, o que constitucionalmente lhe compete. Isto sim, é que é uma inadmissível ingerência na separação de poderes.

Não é uma greve para reivindicar nada em concreto, mas sim para impedir que a AR, leia-se os portugueses, possa discutir a composição do CSMP. E o sindicato até diz que vai estar presente nos trabalhos da AR para fiscalizar! Esta atitude é reveladora de um totalitarismo que não se pode consentir, sendo, aliás, contraditória com o que o próprio sindicato, internamente, diz sobre os poderes do CSMP. Veja-se a este propósito a comunicação que dirigiu no recente dia 10 de dezembro aos seus associados.

O que consta nessa comunicação está em completa contradição com as declarações que o sindicato tem vindo a proferir sobre esta mesma questão.

Claro que deve, aliás, tem, de ser discutida a composição do CSMP, tal como qualquer outra questão com relevo social.

Queremos uma sociedade democrática sem feudos intocáveis para que a Justiça seja cada vez mais uma concretização real e não um mero conceito ideal.

Fica a homenagem a todos os magistrados do MP que, nos lugares que ocupam, lutam por uma sociedade livre do veneno da corrupção e da restante criminalidade.

Apela-se à coerência dos princípios.

Publicado no jornal Público, a 18 de dezembro de 2018.