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(Só faz fé versão lida)
«Senhora Presidente da Assembleia da República
Senhor Primeiro-Ministro,
Senhoras e senhores ministros
Senhoras e senhores deputados,
Discutimos, hoje, pelo segundo dia, na generalidade, o Orçamento do Estado para 2014.
Sobre os pressupostos financeiros que condicionam a elaboração do orçamento ouviram, ontem, a senhora Ministra de Estado e das Finanças.
Sobre as preocupações económicas que foi possível acautelar, o senhor Ministro da Economia.
Sobre as restantes prioridades que, em cada sector, se impõem neste exigente exercício orçamental, cada um de nós estará nesta Assembleia a partir da próxima semana.
Se me dirijo, hoje, a esta câmara não é para entrar em grandes detalhes sobre as contas públicas. Nem para tentar convencer os deputados das virtudes técnicas deste orçamento.
Se me dirijo, hoje, à Assembleia é para reforçar a exigência de um consenso expressivamente alargado na viabilização deste documento estruturante da acção do estado.
Sei que este apelo pode parecer estranho a escassas horas da primeira das votações. Pode parecer ainda mais estranho quando existe uma maioria sólida e coesa que garante a aprovação do orçamento.
Alguns até podem ver nestes sucessivos apelos a um consenso uma espécie de táctica política. Seja para comprometer a oposição, seja para ocupar espaço mediático.
Se há coisa que ficou clara nestes três anos é que esta maioria nunca fugiu à responsabilidade de governar.
Nunca precisou de comprometer terceiros. Nunca precisou de companhia nas decisões. Mesmo nas mais impopulares. Nunca precisámos de desculpas.
E todos os críticos são unânimes quando julgam este governo como um dos piores na arte da comunicação política.
Se digo isto é para excluir hipóteses. Os apelos deste governo para um consenso não são nem por tacticismo político nem por estratégia de comunicação.
Há fundamentalmente três razões que nos levam a repetir este apelo:
A primeira é o próprio sistema político, tal como o conhecemos. Este é um momento peculiar.
Debatemos um orçamento depois de todos os grupos parlamentares da oposição já terem anunciado o seu sentido de voto.
Alguns fizeram-no há mais de dois meses. Anunciaram que votariam contra o Orçamento ainda antes de ser conhecido.
Como se isso fosse normal ou aceitável, nomeadamente, numa época excepcional da nossa história onde cada palavra ou ato de um alto responsável político é escrutinada e tem consequências, interna e externamente.
Discutir um Orçamento da dimensão histórica deste, com opiniões pré anunciadas e publicadas nos jornais, numa fuga ao debate construtivo no local próprio – o Parlamento - é como participarmos num jogo com o resultado combinado. Não credibiliza a acção política, não prestigia os protagonistas e reforça a desconfiança das pessoas no sistema político.
Da mesma forma passámos todos os limites no tom do debate político:
Ladrões?
Criminosos?
Traidores?
E sobre a reforma do estado até se ouviu a expressão “declaração de guerra”. Declaração de guerra!
No momento em que o país e dez milhões de portugueses, mais precisavam da racionalidade de quem os representa, os políticos parece que perderam a capacidade de medir as palavras. A sua seriedade. A sua gravidade. O debate político passou a ser feito com adjetivos.
Se oiço o deputado Jerónimo de Sousa a defender a nacionalização da banca posso não concordar, mas não ponho em causa que está a defender o que acredita estar certo.
Se oiço o deputado João Semedo criticar a posição do governo em relação à Troika posso não concordar, mas não ponho em causa que está a defender o que acredita ser melhor para o país.
Sejamos claros: Nenhum deputado desta Assembleia gosta mais do seu país do que eu. Nenhum deputado desta Assembleia gosta mais do seu país do qualquer membro deste governo.
Senhoras e senhores deputados
Há limites que todos nós devemos preservar. Porque são esses limites que reforçam ou minam a confiança das pessoas no sistema e nas instituições.
Regresso à questão do consenso. Porque há uma segunda razão para repetirmos este apelo.
Disse no Dia Exército que todos os soldados estavam obrigados a ser ministros das Finanças.
Mas na verdade os tempos que vivemos fizeram de todos os portugueses ministros das suas finanças.
Os portugueses estão obrigados a isso. A procurar soluções, a encontrar compromissos. A fazer contas. Em todas as suas decisões. Nas mais pequenas e nas mais importantes.
Todos os dias são obrigados a garantir o que é essencial e a abdicar do que é desnecessário. Também eles reajustaram os seus custos. Reajustaram as suas vidas.
E da mesma forma os empresários souberam reorganizar as suas empresas. Eles são ministros das Finanças. E todos nesta sala temos uma obrigação com estes cidadãos: Garantir que o Estado tem as mesmas preocupações.
Que o Estado procura soluções, que faz contas, que garante o essencial e abdica do que é desnecessário. Garantir que também o estado reorganiza a sua vida.
Deixe-me que dê como exemplo a Defesa Nacional e a reforma que estamos a desenvolver. Alguém nesta sala contesta a otimização de custos e o aumento da operacionalidade das Forças Armadas?
Todos nós estamos de acordo quanto aos princípios desta Reforma. Podemos discordar desta ou daquela medida mas não dos seus fundamentos.
E foi isso que nos permitiu pensar, planear e estar a executar, em conjunto com as chefias militares, uma das mais ambiciosas, coerentes e profundas reformas neste sector.
Uma reforma que perdurará para além desta legislatura.
Não por mérito do ministro mas, provavelmente por causa do entendimento mais racional e menos apaixonado que todos os partidos têm sobre esta matéria.
Repito: Menos apaixonado. Porque se falarmos sobre o Serviço Nacional de Saúde ou sobre a escola pública em Portugal, o tom e as palavras mudam:
Não me surpreende a capacidade de diálogo e de entendimento dos partidos em matéria de Defesa Nacional. O que me surpreende é a falta de capacidade de diálogo e de entendimento em quase todas as outras matérias.
Senhoras e senhores Deputados
A necessidade óbvia, evidente e inteligível de reformar o Estado não desaparece porque alguns de nós decidem ignorá-la.
Não chegar a um entendimento, agora, significa que em dois ou três anos estaremos novamente a discutir a reforma do Estado.
Alguns podem argumentar que há diferenças insanáveis. Mas li no outro dia que Loures vai ser governada em coligação. Pelo PCP e pelo PSD.
Dois partidos tão diferentes que souberam entender-se no que consideravam essencial.
Se o PCP é capaz de chegar a um acordo com o PSD para governar uma câmara durante quatro anos como é possível os partidos não chegarem a um acordo quanto aos princípios essenciais de uma reforma do Estado?
O país não merece menos esforço que a vontade que Loures.
Mas há ainda um último argumento que justifica um consenso.
Esta é uma época excepcional da nossa história. Cada discurso proferido, cada palavra dita, cada gesto é escrutinado, analisado, medido e quantificado. Seja dentro das nossas fronteiras seja numa sala de mercados em Londres. Um escrutínio com consequências.
A falta de entendimento em matérias essenciais tem um custo financeiro, real e efectivo, para o Estado e para os portugueses.
São essas consequências que vão ditar a forma como o país e dez milhões de portugueses saem do programa de ajustamento financeiro em 2014.
Podemos preferir ignorar esta realidade mas a verdade é que a condição de sucesso do nosso destino comum está directamente associada à forma responsável, rigorosa como discutirmos e aprovarmos este Orçamento de Estado.
Não me sentiria bem com a minha consciência se não dissesse isto hoje.
Senhoras e senhores Deputados
O óbvio, para os partidos da oposição, é votar contra o orçamento. O óbvio é criticar o orçamento. O óbvio é dizer que o orçamento é obra do governo e ficar por aí.
Não peço que votem favoravelmente um documento com o qual não concordam. Peço que o viabilizem na generalidade, que apresentem propostas alternativas, que o discutam até à exaustão na especialidade.
Que todos demonstremos aos portugueses que fomos para além do óbvio.
Que demonstremos que este debate não estava decidido há dois meses atrás. Que esta Assembleia é capaz de construir diálogos e compromissos.
Está nas mãos dos deputados mostrar, ao contrário do que tantos repetem, que os políticos, nesta fase crítica de Portugal, são capazes de por de lado as suas diferenças partidárias e ambições pessoais».