Entrevista a Paulo Mota Pinto

10 de dezembro de 2018
PSD

Paulo Mota Pinto é o presidente da mesa do Congresso Nacional do PSD e deu uma entrevista ao DN-TSF. Leia aqui:

Quantas eleições pode o PSD perder com este líder até chegar ao poder?
Até agora ainda não perdeu nenhuma. E acho que temos de afastar o hábito que existe de questionar as lideranças sempre que há uma derrota eleitoral. Os projetos políticos têm mandatos.

Se o PSD não vencer as legislativas Rui Rio tem condições para se manter na liderança?
O mandato acaba em fevereiro de 2020. É pouco depois das eleições. O PSD tem de fazer, na altura, uma reflexão, um balanço do mandato, tendo em conta tudo o que aconteceu. Quer, evidentemente, os resultados eleitorais, o ambiente em que decorreu o mandato, as propostas, o que se conseguiu implementar, o tipo de discurso, por exemplo, as estruturas que foram criadas, a recetividade à mensagem... Também, já agora, quero dizer que não me lembro, na nossa história democrática, de ver uma atuação tão persistente interna, que objetivamente faz o jogo dos adversários do PSD. Por um grupo, um conjunto de militantes que, evidentemente, na altura também estarão a ser avaliados.

Quem é a mão por detrás do arbusto?
Não faço processos de intenções. Agora se me perguntam quais são as motivações, o que me parece que existe por detrás deste clima... acho que há duas. Pessoal, pessoas que estão profissionalizadas na política e têm alguma dependência e têm receio

De perder o lugar na Assembleia?
Claramente. Mas há também uma motivação política pior. Que se sente sobretudo nalgum clima mediático. E que conflui com uma coisa que acontece na Europa, não é só em Portugal. Há uma espécie de regresso do discurso da direita populista. E o PSD sempre foi muito apetecível como o grande partido que poderia ser transformado num partido de direita populista em Portugal. E há realmente setores que têm esse discurso e que pretendem transformar o PSD nesse partido. Esta direção tem uma linha social-democrata que pretende fazer uma barreira a esse discurso. Há uma diferença entre um partido de centro, social-democrata, moderno, enfim, aberto à sociedade e o regresso de uma direita conservadora, perigosa, que no fundo apela a diversos medos. E acho que existe esse projeto também em Portugal.

Está a falar de interesses de dentro do partido ou exógenos? 
Há de tudo. Há pessoas de dentro do partido que estão prontos a pactuar com esse tipo de discurso, ou não definem o seu discurso e depois, nas pequenas táticas, pactuarão com esse discurso. E há também de fora, evidentemente. Não quero agora estar aqui a dar nomes de órgãos de comunicação social e de movimentos, mas há também de fora tentativas de impulsionar isso. Isso é evidente. Olhe, uma coisa em que se vê muito isso é na utilização de um tema clássico do populismo da direita que é o antiparlamentarismo. Eu sou muito favorável a que haja transparência e investigação total e crítica, evidentemente, a quem tem comportamentos pouco éticos. Mas o facto de se alvejar sistematicamente apenas o PSD nisso tem a ver com isso.

Há alguém que tem interesse em que esses casos sejam visíveis...
É preciso total transparência. É até um apelo que faço à comunicação social. Que investigue os 230 deputados. Não é pelo caso do secretário-geral do PSD que... aliás, na acusação que lhe fazem está a justificação da falta dele. Estava em trabalho político. E, aliás, já tinha ido ao Parlamento de manhã. Portanto, tinha direito às senhas de presença. Não cometeu nenhuma irregularidade nesse sentido. É por aqueles que realmente não estão... e aí sim, para ganho financeiro. Mas, só um cego é que não vê que a direita está a voltar na Europa e que já esse projeto também em Portugal. E acho que o PSD é uma barreira contra isso.

E o contrário também. O PSD parece ser o sítio por onde essa direita poderá entrar.
Há um pouco essa tentativa. Claro que tivemos alguns casos de pessoas que se afastaram. Perceberam que estavam mal no PSD e foram fazer os seus projetos, digamos, de empreendedorismo político.

Mas teme que isso aconteça.
Há o regresso dessa direita em alguma da oposição interna do PSD.

Fernando Negrão defende sanções mais duras para todos os deputados faltosos e com comportamentos, diria, menos adequados?
Penso que deve haver sanções, embora queria dizer o seguinte. Eu tenho uma visão dos Parlamentos que não é burocrática. Os parlamentares não são funcionários. Esta ideia de picar o ponto e andarmos a controlar a falta... é uma ideia que diminui a função do deputado. O deputado tem, sobretudo, uma responsabilidade política perante o seu eleitorado. Deve haver transparência, deve ser controlado. Agora a ideia de fazer um processo disciplinar por faltas ou por estar mais ou menos vezes... Há diversas formas de exercer o mandato. Mas os deputados devem ser um exemplo ético também. Sim, acho que sim.

Suponho que esteve seis anos como deputado...
Sim, mas eu tinha uma posição especial porque era presidente da Comissão.

Alguma vez faltou e marcaram-lhe a presença por si?
Não. Isso não.

Estes incidentes, desculpe insistir, não jogam mal com o chamado banho de ética, que Rui Rio assumiu, inicialmente, como prioridade?
Bem... o presidente do PSD já teve um secretário-geral que foi afastado, que se afastou, por razões éticas. Não gosto muito dessa expressão, sinceramente, "banho de ética". Mas, isso está de acordo, evidentemente, com as palavras dele. Não quero falar muito disto porque acho que isto alimenta o antiparlamentarismo e que acho que o Parlamento é uma peça central da nossa democracia. Deve ser valorizada. É um tema que, sinceramente, me incomoda um pouco.

Voltando um pouco atrás, estes incidentes e esta divisão interna não são também uma responsabilidade da direção e do seu estilo de liderança?

Em relação ao grupo parlamentar há aqui uma razão estrutural. Acontece frequentemente que, mudando, depois de umas eleições, o líder, os deputados que estão tenham sido escolhidos pela anterior direção. Isso é uma questão estrutural do sistema. Embora, houve vários que foram escolhidos pela anterior direção que não têm tido um comportamento muito censurável.

Ou seja, a banca parlamentar é hostil em relação à nova liderança?
Acho que há uma especulação muito grande à volta da bancada parlamentar. Tenho dificuldades em dar responsabilidades ao deputado A, B ou C, mas disse que há uma componente que tem a ver com a preservação dos lugares, que é evidente. Qualquer pessoa do eleitorado, do partido percebe isso. E, portanto, há realmente um grupo que tem vindo, de forma inusitada, a fazer objetivamente o jogo do Partido Socialista. Custe o que custar. Para o partido e para o país. Evidentemente essas pessoas carregarão uma evidente responsabilidade sobre os seus ombros, também, no dia das eleições.

Se António Costa conseguir uma maioria absoluta será responsabilidade também dos críticos de Rui Rio?
Acho que os militantes terão, na altura, os olhos postos no partido e também nesse clima. Quando for feita a avaliação. É claro que, em termos institucionais, há sempre uma responsabilidade do presidente do partido pelo que acontece com o partido. Mas, enfim, como digo, não tenho memória de uma, não quero chamar-lhe campanha, mas de uma atuação tão diretamente visando o prejuízo do partido, intencional, sistemática, com a criação de incidentes, falsos, acusação de silenciamento - falsas - e outras coisas desse tipo. Não tenho memória no PS ou no PSD. Por exemplo, quando o Dr. António Costa ganhou as eleições internas, o partido acalmou-se. Perdeu as eleições mas não houve isto... Houve antes. Estou convencido que o PSD tem todas as condições para ter um bom resultado. Tem condições e vai ter cada vez mais. Porque as condições do país, as pessoas estão a ver, vão cada vez mais propiciar isso.

Em relação a essas suas últimas palavras o deputado Miguel Morgado disse, numa entrevista, que temia mais o risco de definhamento do PSD do que essas guerras internas.
Eu não li essa entrevista. É a avaliação dele. Não sei qual a experiência de militante ou de militância ou de identificação com o partido... que o deputado Miguel Morgado... é assim que ele se chama? Se baseia...

Miguel Morgado foi assessor político de Pedro Passos Coelho.
Eu conheço mal o pensamento político dele, mas, penso que... é uma ideia que eu tenho dos escritos que tenho dele ... é uma pessoa que se situa mais à direita.

Para dar-lhe um exemplo do pensamento político dele. Defende uma remodelação da direita, onde o PSD seria, naturalmente, líder dessa refundação. Isso não seria um caminho normal, também, para o PSD?
Não sabia disso, mas, de certa forma, vem ao encontro do que estava a dizer inicialmente. Há pessoas que no partido que pretendem transformar o PSD no grande partido da direita, numa direita que, no fundo, não é uma direita moderna, é uma direita conservadora, aberta aos populismos. O PSD sempre foi um partido social democrata, um partido de centro (inicialmente dizia-se de centro-esquerda). Não é esse o meu projeto. Não é o projeto da matriz identitária do PSD, não é dos militantes nem é, com certeza, dos votantes do PSD. É assim que eu vejo as coisas.

Pedro Passos Coelho colocou o partido muito mais à direita do que ele estava e foi esse partido que herdou Rui Rio. E a verdade é que Pedro Passos Coelho acabou por ganhar as eleições. O que é que o leva a dizer que o partido não tem a ganhar com essa definição de direita?
Para mim é evidente que as eleições, em termos estratégicos, se ganham, se vão disputar, ao centro. Depois o partido não tem a ganhar no sentido político. A minha posição ideológica é a de que Portugal precisa de uma grande força de centro, social-democrata, com preocupações de justiça social, que não seja uma força que carrega essas bandeiras da direita populista, que, no fundo, abre esse tipo de medos. Como vemos pela Europa fora. A Europa e Portugal têm muito a perder com isso. Eu rejeito esse projeto. Foi o projeto de Pedro Passos Coelho? Acho que não. Ele teve alguma indefinição, ao longo da carreira política, do projeto. Teve uma fase mais liberal, outras fases em que não era assim.. ele entrou numa altura muito difícil, em que realmente foi necessário transmitir a mensagem: coligar-se à direita e transmitir uma mensagem de alguma dureza. Acho que nalguns pontos foi longe demais, acho que devia ter puxado, desde o início, pelo Partido Socialista para qualquer revisão do programa e para a execução conjunta ou a aprovação de algumas medidas. Porque foi o PS que nos levou àquela situação. Não é isso que querem os militantes, não é isso que querem os votantes do PSD. Isso tenho a certeza.

Passos Coelho é a mão por detrás do arbusto?
Não. Não digo isso. Até digo que ele teve uma missão patriótica muito importante e vai ficar na história por isso. A grande resiliência que ele mostrou foi muito importante. Não lhe estou a imputar nada. Que atualmente existe esse projeto, existe.

Ou seja, identifica no PSD uma ala que tem saudades de Pedro Passos Coelho?
Com certeza. Isso é normal.

Essas saudades são suficientemente fortes para alguma parte do PSD pensar num Congresso extraordinário antes das eleições legislativas?
Aí, como presidente da mesa do Congresso, o que posso dizer é que não me posso estar a prenunciar sobre tentativas de convocação do Congresso. Posso dizer que, como presidente da mesa, cumprirei, escrupulosamente, os estatutos. Agora, também lhe quero dizer... neste ambiente estou convencido que um Congresso extraordinário do partido reforçaria, com uma grande maioria, mesmo muito grande, a atual direção. Os militantes sabem o que se tem passado e o que se está a passar. E um dos aspetos mais negativos do que se está a passar é haver uma certa distração das realidades do país para a realidade interna do PSD. O mais importante para o país não é, neste momento, isso. Há greve dos professores, médicos, enfermeiros, comboios, juízes, polícias, estivadores, guardas prisionais, funcionários públicos. Os serviços essenciais estão em degradação clara. O PSD tem vindo a chamar a atenção para isso. Esta política de cativações, o garrote que as cativações tem levado a cabo, tem efeito noutras áreas importantes: as forças armadas, proteção civil. Isso é importante discutir.

Então, porque é que não se discute? 
O PSD tem chamado a atenção para isso. Mas realmente uma das razões pelas quais o discurso não tem o eco suficiente é porque há uma distração pelo ruído provocado, com eco também externo, de algum de dentro do partido.

Essa ausência de paz social não favorece o PSD também?
Favorece na medida em que é um sintoma de um mal-estar. Problemas reais que existem e que o PSD tem vindo a apontar. E mesmo na área económica. Vamos lá ver. Realmente este Governo conseguiu resultados financeiros positivos, em grande parte à custa das cativações, de previsões orçamentais que não são cumpridas. Mas no plano económico, do crescimento da economia, os resultados são medíocres. Essa é que é a verdade. Eu já vi este filme. Fui vice-presidente da doutora Manuel Ferreira Leite. Não estou a dizer que vá haver, para o ano, uma pré-bancarrota. Não é isso que estou a dizer. Não sou um previsor da desgraça. Mas... é uma situação que se vai degradando aos poucos. O crescimento económico do país, se compararmos com outras pequenas economias abertas, é medíocre. Quando houver uma viragem económica nós somos os primeiros a perder.

Apesar disso, economia cresce. O desemprego caiu. O défice aproxima-se do zero. É mais difícil fazer oposição assim.
Claro que é. Mas vamos ponto por ponto. A economia cresce, mas somos o 19º ou 20º país a crescer. O desemprego caiu. Claro que caiu, e ainda bem que caiu. O desemprego era muito elevado em grande parte sobretudo da crise que nós tivemos. Mas deixe-me dizer-lhe que o emprego tem vindo a ser criado sobretudo em áreas de menor valor acrescentado. Turismo, etc. onde os salários são baixos. Temos de criar mais valor acrescentado em áreas como a indústria. Temos de ter políticas de reindustrialização. Em relação ao défice... bem... vamos ver. Há uma certa insegurança sobre o valor do défice. Até o Eurogrupo critica o ministro Centeno... Mas nem quero imaginar o que seria se fosse o PSD... Nem é tanto a questão institucional que me preocupa. É mais os efeitos disto sobre os serviços públicos. E nós estamos a vê-los agora nas greves.

Quais têm sido os maiores erros deste governo?
O governo tem um problema de raiz: nascer em pacto com forças que não são forças de progresso. São conservadoras, que não querem introduzir as reformas no país para que o país ter a competitividade. E, portanto, para gerar mais riqueza. Isso faz com o governo seja profundamente imobilista. Não é reformista.

Acabou de dizer que as únicas forças que são de facto modernas, progressistas em Portugal são o PS e o PSD.
Bem... o que eu disse é que o PSD é uma força muito mais reformista do que o imobilismo do Partido Socialista tem vindo a mostrar neste Governo.

Com a ameaça à direita, de uma direita conservadora, pouco progressista, etc.
Por isso mesmo.

Qual é a hipótese que existe, então, de um bloco central?
Eu realmente acho que o PS e o PSD são duas forças essenciais para o sistema democrático português. Mas não sou um defensor do bloco central. É preciso haver entendimentos nalgumas áreas essenciais. Mas a hipótese de haver um bloco central neste momento não quero dizer nula, mas é muito reduzida.

Que impacto tem a seu entender, a aliança do Pedro Santana Lopes? 
Acho que terá um impacto, também não quero dizer praticamente nulo, mas quase. Muito reduzido. A Aliança é um partido que nasceu de um projeto pessoal. Os portugueses assistiram a isso. Foi fundado porque o fundador foi derrotado na eleição para a presidência do PSD. Não nasce por causa de um projeto para o país, mas por causa de um projeto para uma pessoa. Ou de uma pessoa. E penso que os portugueses, mesmo o eleitorado do PSD, também, não darão votos e confiança a um projeto assim.

Ainda assim a Aliança apresenta um candidato às eleições europeias que é um dos homens do Presidente. Paulo Sande, consultor de Marcelo Rebelo de Sousa. Toda esta lógica não afetará, de facto, o PSD?
Em relação à questão de ele ser um dos homens do Presidente, não se se se poderá chamar assim a todos os assessores. Mas isso já foi esclarecido.

É uma possibilidade vermos Paulo Mota Pinto como cabeça de lista às europeias? 
Não estou na política porque preciso de emprego. E estamos a entrar numa fase pré-eleitoral, em que essas decisões são discutidas e tomadas e eu não quero, nem posso dizer sequer uma palavra sobre isso.